Wander Piroli
Atrás do balcão, o rapaz de cabeça pelada e avental olha o
crioulão deroupa limpa e remendada, acompanhado de dois meninos de tênis
branco, um maisvelho e outro mais novo, mas ambos com menos de dez anos. Os
três atravessam o salão, cuidadosa mas resolutamente, e se dirigem para o
cômodo dos fundos, onde há seis mesas desertas. O rapaz de cabeça pelada vai
ver o que eles querem. O homem pergunta em quanto fica uma cerveja, dois
guaranás e dois pãezinhos.
— Duzentos e vinte.
O preto concentra-se, aritmético, e confirma o pedido.
— Que tal o pão com molho? — sugere o rapaz.
— Como?
— Passar o pão no molho da almôndega. Fica muito mais gostoso.
O homem olha para os meninos.
— O preço é o mesmo — informa o rapaz.
— Está certo.
Os três sentam-se numa das
mesas, de forma canhestra, como se o estivessem fazendo pela primeira vez na
vida.
O rapaz de cabeça pelada traz as bebidas e os copos e, em seguida,
numpratinho, os dois pães com meia almôndega cada um. O homem e (mais do que
ele)os meninos olham para dentro dos pães, enquanto o rapaz cúmplice se retira.
Os meninos aguardam que a
mão adulta leve solene o copo de cerveja até a boca, depois cada um prova o seu
guaraná e morde o primeiro bocado do pão. O homem toma a cerveja em pequenos
goles, observando criteriosamente o menino mais velho e o menino mais novo
absorvidos com o sanduíche e a bebida.
Eles não têm pressa. O grande homem e seus dois meninos. E
permanecem para sempre, humanos e indestrutíveis, sentados naquela mesa.
Wander Piroli era mineiro de Belo Horizonte, nascido em 1931.
Escreveu vários livros, para adultos, jovens e crianças. Também trabalhou como
jornalista. O Conto acima foi publicado originalmente em “A mãe e o filho da
mãe” (1966).
Retirado do livro de Conto em conto
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